A acção de Os Maias passa-se em Lisboa, na
segunda metade do século XIX.
Afonso da Maia, um aristocrata representante dos
heróicos Afonsos do antanho (do passado), era um rico proprietário
que se fixou no "Ramalhete" em 1875, onde pretendia
acabar os seus dias, na companhia do seu neto Carlos,
recém-formado em Medicina, na Universidade de Coimbra.
Expulso de casa pelo progenitor
(Caetano da Maia), quando ainda era um jovem liberal e
revolucionário ("um jacobino", de acordo com as palavras
do pai), Afonso fora inicialmente viver para a Quinta de
Santa Olávia, sita nas margens do Douro, antes de se
exilar em Inglaterra.
Casa com D. Maria Eduarda Runa de quem tem um único
filho - Pedro da Maia -, que recebe uma educação
tipicamente portuguesa, uma educação que tinha como
princípios orientadores os emanados na Cartilha, uma
educação beata, de um falso religiosismo, proporcionada
sobretudo pela mãe e pelo Pe. Vasques, uma educação tida
como perfeita pela sociedade
burguesa da
Pedro da Maia e Maria Monforte.
época, mas que depressa se dissipará pelos botequins e
lupanares (bordéis) lisboetas, após a morte da
sua superprotectora mamã .
Contra a vontade do pai, Pedro da Maia casou com a
"negreira" Maria de Monforte, de quem vem a ter duas
crianças: uma menina (Maria Eduarda) e um menino (Carlos
Eduardo).
Um dia, Pedro feriu, inadvertidamente, numa
caçada, Tancredo, um napolitano que lhe fora apresentado pelo
secretário da delegação inglesa. Levado para sua casa
com o fim de ser tratado, esse napolitano acabou por
fugir para Viena com Maria Monforte, que levou consigo a
filha pequenina, nunca mais se vindo a saber do seu
paradeiro, mau
grado as inúmeras tentativas de Afonso, que tudo fez
para a encontrar. Por confusão, e erroneamente, foi dada
como morta. O menino, esse, ficou na
companhia do pai, o qual, no entanto, destroçado com o infortúnio que o
abalou, suicidou-se na propriedade da família, em
Benfica.
A propriedade é por isso vendida, apesar da oposição do
procurador Vilaça (que argumentava que os Maias deixavam
de ter uma casa apresentável em Lisboa) e
Carlos da Maia passou então a viver com o avô Afonso,
que muito lhe queria, na Quinta de Santa Olávia. Recebeu
uma educação à inglesa, ministrada pelo
preceptor inglês Brown, para o efeito contratado. Mais tarde, formou-se em Medicina e tornou-se um rapaz
esbelto e inteligente, mas também um diletante e um dândi. Terminada a
formatura, viajou pela Europa e, de regresso passado um
ano, foi instalar-se definitivamente com o avô no
Ramalhete, o velho palacete, recuperado com esmero por
Afonso da Maia, que depositava grandes esperanças em
Carlos. Rodeavam-no alguns amigos e pessoas com quem lidava
mais de perto,
para o bem e para o mal, de entre os quais se
podem apontar: João da Ega (literato oriundo de Celorico
de Basto, de
ideias avançadas e boémio, amante da esposa do banqueiro
Cohen), Alencar (poeta romântico, onde se viu retratado Bulhão Pato), o viúvo
Eusebiozinho e Dâmaso
Salcede (dois refinados hipócritas), o incompreendido maestro Cruges
e o
jornalista corrupto Palma
Cavalão.
Depois de um breve fervor no desempenho da sua profissão
de médico, Carlos acaba por embrenhar-se numa existência
de aristocrata, balofa e inútil, e, seguindo os exemplos pouco
edificantes dos seus libertinos amigos, vê-se dividido,
inicialmente, entre duas paixões: a nutrida pela Condessa de Gouvarinho,
que abandonará abruptamente, mais tarde, desiludido com a
petulância, possessão e insaciedade amorosa dessa mulher; e a da
Maria Eduarda, suposta esposa do brasileiro Castro
Gomes.
Ao princípio não teve muito êxito na perseguição
que moveu a Maria Eduarda, mas um dia foi chamado a casa
dela para ver uma doente - Rosa, a própria filha de
Maria Eduarda . Começaram então
a entender-se e, na ausência de Castro Gomes, reuniam-se com muita
frequência
numa casa de campo (a Toca) que Carlos nessa altura comprou
para aí instalar aquela que passou a ser
sua amante.
Carlos da Maia e Maria Eduarda.
Castro Gomes, que veio a saber das infidelidades da
Maria Eduarda,
desiludiu Carlos, quando um dia o procurou e lhe contou
que ela não era
sua mulher, mas sim sua amante, uma das muitas que
costumava levar de
cidade em cidade, até se aborrecer ou encontrar outra
melhor. Esclareceu, ainda, que se não
julgava ofendido com o facto de Carlos se ter amantizado
com Maria Eduarda, acrescentando mesmo que podia ficar
com ela à vontade. Carlos perdeu, então, muito do
interesse que Maria Eduarda nele despertara, não só por
saber que ela, afinal, não passava de "mais uma ",
mas também porque o que
lhe dava prazer era o "adulteriozinho".
Entretanto, chega de Paris um emigrante
- o democrata Guimarães, redactor do "Rappel". Procurava Maria
Eduarda, dizendo ter sido amigo de sua mãe. De facto,
era portador de um pequeno cofre que essa senhora lhe
tinha entregue antes de morrer e onde existiam
documentos que identificavam Maria Eduarda e garantiam
para ela direitos a uma choruda herança. Ora, essa
mulher era precisamente Maria Monforte que fugira com o
napolitano: nem mais nem menos que a mãe de Carlos da
Maia, o qual, na sequência dessa constatação, passava
a ser irmão da
amante!...
Carlos vem a saber toda a verdade pelo Vilaça e, mais
tarde, por Ega. Não obstante, continua
durante mais algum tempo a
manter relações com a irmã, agora abertamente incestuosas.
Aliás, é a descoberta desses
amores incestuosos que estará na origem da morte,
por apoplexia, do bom e generoso
Afonso da Maia.
A família dos Maias desmorona-se, assim, de forma
muito rápida e inexorável. Maria Eduarda foi
mandada para Paris com uma boa maquia, provinda da
herança deixada pelo seu avô, e que Carlos decidira
repartir com ela, vindo, posteriormente a casar-se com Mr. de
Trelain e passando a residir em Orléans, numa quinta que
lá comprara e que tinha o nome de Les Rosières. Carlos,
por sua vez, vai correr mundo, para afogar as suas
mágoas, naquilo que se pode considerar como um
comportamento tipicamente romântico (fuga dos
problemas), ele que era um realista assumido...
Regressa ao fim de
dez anos para saborear o doce convívio ou a situação,
por vezes caricata, dos velhos
amigos/conhecidos - Ega, Tomás de Alencar, Cruges,
Dâmaso Salcede. Da boca de Ega, ouve esta frase que
resume a existência de ambos: «falhámos a vida,
menino!...». E é com um diálogo pitoresco entre os
dois que a obra termina.
Ambos concluem ter falhado, porque viveram como
"indivíduos inferiores que se governam
[governavam] pelo sentimento e
não pela razão...". No fundo, são vítimas de uma
sociedade decadente, nunca deixando de se comportar como
autênticos românticos, contrariando o que sempre
apregoaram a nível estético - repúdio do sentimentalismo
romântico e defesa do realismo.