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Sermão de Santo António aos Peixes

 

PARTE III

 

                                                                                                                             LOUVORES AOS PEIXES, EM PARTICULAR

                                       

 

O SANTO PEIXE DE TOBIAS
 

   O seu fel curou da cegueira do pai de Tobias (Tobias, o velho)

 

O seu coração afugentou o demónio Asmodeu  que já tinha matado sete maridos a Sara, com quem o filho de Tobias (o moço) viria a matrimoniar-se.

 

 

Também os homens precisavam de alguém que fosse fel e que lhes desse luz e os fizesse sair da cegueira (escuridão) em que viviam e de um coração bondoso que os levasse a praticar o Bem e a escorraçar o diabo, a encarnação do Mal.

Ora, esse alguém existiu.  Foi Santo António, cuja boca lançou fel (= palavras amargas) sobre aqueles que o não queriam ouvir, com a óbvia intenção de os alumiar e de lhes curar as cegueiras, e cujo coração, de tão bondoso, afugentava os Demónios das pessoas, purificando-as. Só uma diferença existia entre Santo António e o Santo Peixe de Tobias: este último abriu a boca contra quem se lavava (Tobias); o primeiro abria a sua contra os que se não queriam lavar.
 

 

 

   A RÉMORA

 

 

  Um peixe pequeno, mas que "se se pega ao leme de uma nau da índia, apesar das velas e dos ventos e do seu próprio peso e grandeza, aprende e amarra mais que as mesmas âncoras, sem se poder mover, nem ir por diante."

 

 

Quem dera que na terra houvesse alguma rémora que fizesse parar as

                                          

                                            NAUS  da Soberba

                                                         da Vingança

                                                         da Cobiça

                                                         da Sensualidade!


Uma rémora houve na terra que amansou essas naus: foi a língua de Santo António que deteve o orgulho, a fúria, a ira, o ódio, a ambição e a depravação das pessoas, acenando-lhes com a bandeira da paz, da justiça, do amor.
Infelizmente, nem sempre essa língua foi ouvida pelos Homens. Daí que na terra haja tantos naufrágios e tantos náufragos!...

 

 

  O TORPEDO
 

 

 

  Um peixe pequenino que emite vibrações quando fica aprisionado no anzol, de tal modo que faz tremer o braço do pescador..

 

 

Oxalá que na terra houvesse quem fizesse tremer a consciência das pessoas, levando-as a praticar o Bem. Que pena, "pescando os homens coisas de tanto peso, lhes não trema a mão e o braço"! Que pena que não houvesse alguém que lhes fizesse vibrar as cordas da sua alma! Santo António bem o tentou...

 

 

 

   O QUATRO-OLHOS

Com um tamanho que varia entre os 26 e os 50 cm, o quatro-olhos pode ser encontrado em águas doces ou salobras. E ao contrário do que poderíamos ser levados a pensar, este peixe tem dois olhos. No entanto, cada olho é uma estrutura dupla, que se projecta acima da linha da água. A córnea está dividida por uma banda pigmentada horizontal numa zona superior, fortemente convexa e numa zona inferior, plana. A íris possui duas projecções que dividem a pupila em duas, a superior adaptada à visão aérea e a inferior, adaptada à visão aquática. Devido a esta notável adaptação está muito bem estudado, sendo de salientar o seu interesse em pesquisa oftalmológica. Curiosamente, machos e fêmeas possuem os seus órgãos sexuais orientados, ou para a direita, ou para a esquerda. Devido a este facto, os machos destros apenas podem copular com fêmeas sinistras e vice-versa.

 

um peixinho que tem quatro olhos: dois fixam-se no céu para o alertar para o perigo que vem das aves marítimas; os outros dois olham para o fundo do mar, de forma a preveni-lo para o ataque de outros peixes.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Os Homens precisavam, do mesmo modo, de ter quatro olhos: dois para olharem "direitamente" para cima, para o Paraíso; os outros dois para olharem "direitamente" para baixo, para o Inferno. Talvez assim praticassem o Bem e evitassem o Mal.
 

  CONCLUSÃO

 

 

Esta parte  termina com uma referência à recompensa dada por Deus aos peixes, porque eles são o alimento dos pobres e o sustento nos tempos de penitência (Quaresma), jejum e abstinência, enquanto o alimento dos ricos é preferencialmente constituído pelas aves e pelos outros animais. Mesmo aqueles peixes que são mais servidos à mesa dos poderosos (os Solhos e os Salmões) não foram tão abençoados pelo Criador, dado "que são muito contados".

Inversamente, aqueles que formam a base da alimentação dos pobres (as sardinhas) são benditos, reproduzindo-se em grande número - "Crescei peixes, crescei e multiplicai-vos, e Deus vos confirme a sua bênção".
 

 

Elaborado por

Joaquim Matias da Silva

 

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